BLOGS CIENTÍFICOS

Dieta e urticária crônica: modificações dietéticas como um tratamento estratégico na nutrição estética (2020)

Autores: Joanna Jaros, Vivian Y. Shi, Rajani Katta
Revista: Dermatology Practical and Conceptual (2019)

Introdução

A urticária espontânea crônica (UC) é uma condição dermatológica recorrente-remitente. Ela se manifesta de forma periódica e esporádica, afetando a qualidade de vida do indivíduo. A etiologia da doença ainda não é bem compreendida, nem todos os fatores considerados “gatilhos” para o desencadeamento dos sintomas. Entre esses fatores está a alimentação, alguns alimentos demonstraram potencial como gatilhos imunológicos e não imunológicos. Essa revisão buscou entender o papel das modificações dietéticas como parte do tratamento para urticária espontânea crônica.

Resultados e discussão

Patogênese
Ao nível celular, a principal característica é a liberação de mediadores pró-inflamatórios, como a histamina, resultando em vasodilatação, extravasamento do plasma, angioedema e pápulas. Uma série de fatores pode desencadear a ativação celular, tanto imunológica quanto não imunológica. O tratamento primário é realizado com anti-histamínicos.

Urticária crônica e dieta
Estudos demonstram resultados intrigantes associando piora dos sintomas de urticária crônica com o consumo de determinados alimentos. Apesar de ser raro, alergias alimentares podem ser uma das causas para urticária crônica. Intolerâncias alimentares são mais descritas em estudos, podendo essa também ser uma das causas. Alimentos classificados como “gatilhos” podem piorar os sintomas da UC. Em uma revisão envolvendo 1.668 pacientes com UC que seguiram uma dieta de eliminação, 4,9% dos pacientes demonstraram remissão completa dos sintomas e 37,5%, remissão parcial. Entre as dietas, foram relatadas a dieta livre de pseudoalérgenos (pseudo-allergen-free diet), dieta baixa em histamina (low histamine diet) e dietas com restrição do consumo de peixes; todas aplicadas por um período mínimo de 3 meses.

Alergia a galactose-α-1,3-galactose
A galactose-α-1,3-galactose (α-gal) é um oligossacarídeo existente em mamíferos, exceto em humanos e primatas superiores. Pode ser transmitido para humanos por picadas de animais, como carrapatos. Por também estar presente na carne de mamíferos, como boi ou porco, o contágio pode ocorrer pela alimentação. Em um estudo com 245 pacientes, 93% apresentaram urticária, 64% desconforto gastrointestinal e 60% anafilaxia. Considerando a sintomatologia tardia, de 2 a 6 horas após o consumo, um diário alimentar pode auxiliar a identificar respostas associadas ao consumo alimentar.

Hipersensibilidade a Anisakis simplex
Anisakis simplex é um peixe muito consumido, cru, em países como Espanha e Itália. O antígeno pode estar presente na versão crua, marinada ou defumada desse alimento. Um estudo entre 213 italianos com urticária demonstrou que quase 50% deles possuíam sensibilidade para A. simplex. Em outro, uma dieta de 6 meses com exclusão de peixe cru e marinado levou à remissão dos sintomas entre 77% dos participantes.

Glúten
Doenças autoimunes, como a doença celíaca, têm sido associadas à urticária crônica. Há relatos de pacientes com doença celíaca que desenvolveram sintomas de UC após o consumo de glúten. No entanto mais estudos são necessários para consolidar essa associação.

Pseudoalérgenos
São alimentos que geram hipersensibilidades não alérgicas, com sintomas não desencadeados por ativação de IgE. Muitos alimentos podem atuar como pseudoalérgenos, como aqueles que possuem aditivos alimentares (corantes, conservantes ou aromatizantes), compostos vasoativos (ácido acetilsalicílico, histamina e óxido nítrico) ou naturais. Em geral, o teste para essa hipersensibilidade é realizado por uma dieta de eliminação, seguida do teste de provocação oral (TPO). Em alguns estudos, a retirada de alimentos específicos, como o tomate, vinho, ervas e aqueles com aditivos alimentares, resultou na remissão dos sintomas de urticária crônica. No entanto mais estudos com melhor metodologia de grupo controle são necessários.

Aditivos alimentares
Corantes, conservantes, aromatizantes e edulcorantes também são alvos de estudos. Um estudo duplo-cego e controlado, com 838 pacientes em dieta livre de aditivos alimentares, demonstrou melhora dos sintomas para UC em 31% dos participantes. Entretanto outros não tiveram resultados conclusivos.

Histamina
É uma amina vasoativa que atua como importante mediador para o desenvolvimento dos sintomas de UC. A aplicação de dietas baixas em histaminas como estratégia terapêutica complementar tem sido alvo de estudos. Certos alimentos possuem níveis de histamina mais elevados, como frutos do mar, alimentos fermentados, carnes embutidas e defumadas, queijos envelhecidos, tomate, abacate, espinafre e ovo. A quantidade também depende das condições de armazenamento e exposição microbiana. A tolerância para ingestão de histamina é individual e pode estar associada com deficiência da enzima diamina oxidase. Um estudo, entre 56 pacientes com UC, 61% apresentaram melhoras, após 3 semanas, realizando uma dieta baixa em histamina. No entanto, em outros, não foi encontrada nenhuma associação entre os sintomas e a dieta.

Vitamina D
O potencial imunomodulador da vitamina D tem sido de interesse nos estudos com urticária crônica. Em uma meta-análise com 14 estudos, envolvendo 1.655 pacientes, descobriu-se que a prevalência da deficiência de vitamina D era significativamente maior entre indivíduos com UC. Alguns estudos indicam melhora dos sintomas com suplementação de vitamina, mas não há consenso entre dose ou duração do tratamento. O teste para vitamina D, em indivíduos com risco para deficiência, pode ser apropriado para determinar estratégias complementares de tratamento para urticária crônica.

Conclusão
Apesar de alergias alimentares serem raras, pacientes com esse histórico podem apresentar urticária crônica como um dos sintomas. Foi relatada uma piora dos sintomas de urticária crônica com o consumo de alimentos que possuíam aditivos alimentares em sua composição, assim como alimentos naturais, como tomate, ervas e frutos do mar. O mecanismo de ação para essas reações não é conhecido. Apesar de medicamentos anti-histamínicos serem a terapia principal no tratamento, mudanças alimentares visando à melhoria dos sintomas, ou prevenção deles, podem ser estratégias efetivas para alguns; assim como a elaboração de um diário alimentar. Dietas de eliminação apresentaram resultados positivos na remissão dos sintomas, mas devem ser realizadas por curtos períodos ou com o acompanhamento de um nutricionista.

Conflitos de interesse
Os autores não declararam haver conflito de interesse.

Acesso o estudo na íntegra.